Abertura do mercado livre de energia atrai de escolas a condomínios
De olho em uma economia na conta de luz que, em alguns casos, pode chegar a até 40%, restaurantes, varejistas, escolas e até condomínios estão aderindo com força ao mercado livre de energia, uma alternativa ao fornecimento por meio das tradicionais distribuidoras do setor, como Light e Enel. Neste modelo, através de uma empresa intermediária — chamada de comercializadora varejista — o cliente compra eletricidade diretamente das geradoras. Esda energia, no entanto, continua chegando até a instalação do cliente pelas redes da concessionária local.
Com a abertura do mercado livre, este ano, para qualquer cliente do segmento de média e alta tensão, houve um salto no número de clientes. Entre janeiro e julho, foram 13.459 adesões, uma expansão de 35%. E, desses novos clientes, 78% são pequenas e médias empresas.
Contas a partir de R$ 8 mil
O aquecimento do mercado tem atraído empresas de outros segmentos. Vivo, Itaú, Santander e XP são alguns dos estreantes, juntando-se a um total de 116 companhias que hoje já podem vender energia, uma lista que conta também com gigantes do setor como Eletrobras e Equatorial.
O mercado livre tem hoje 51.500 clientes, número que deve chegar a 65 mil até dezembro. Cresceu com força a partir de janeiro, quando todos os consumidores do chamado Grupo A passaram a poder escolher o fornecedor. Antes, apenas companhias com demanda mensal superior a 500 kW e contas em torno de R$ 110 mil a R$ 150 mil, em média, tinham a liberdade de comprar energia além da concessionária. Agora, contas de R$ 8 mil, em média, já estão aptas.
Na busca por preços menores, Claudio Campos, síndico do condomínio Vision Offices, na Barra da Tijuca, decidiu migrar. Ele conta que, em média, o valor da conta mensal da energia consumida nas áreas comuns do condomínio caiu de R$ 130 mil para R$ 65 mil.
Rodrigo Ferreira, presidente da Abracel (associação que reúne os comercializadores de energia), explica que o mercado livre oferece contratos com diversa durações, podendo chegar a cinco anos, e mecanismos diferentes de descontos. Por isso, orienta que os interessados pesquisem as opções antes de aderir.
O setor estima haver um potencial de 200 mil empresas de pequenos portes que podem migrar para o mercado livre. A abertura total para incluir consumidores residenciais, que são 90 milhões no Brasil, está prevista para ocorrer até o fim desta década, mas ainda não há data marcada.
Perfil de consumo
A TYR, uma varejista comercializadora de energia, já conta com 350 contratos e prevê chegar a mil em 2025. Com atuação em 12 estados, como Rio e São Paulo, a companhia se prepara para abrir filial em Fortaleza. Segundo Eduardo Miranda, CEO da empresa, é natural haver muitas dúvidas.
— Quando o cliente opta pelo mercado livre, ele está comprando apenas a energia elétrica. Não é uma mudança física, pois ele continuará sendo atendido pela distribuidora, que é a dona da rede de transmissão. Uma vez que decide mudar, nós cuidamos do processo de migração, mas ele continuará recebendo duas contas: uma com o preço da energia, e outra com os custos de transporte da eletricidade — explica Miranda.
Tatiana Brezolin Magrin, gerente comercial da Ludfor, com 4 mil clientes, menciona a atenção especial à duração dos contratos, em um momento como o atual, de preços elevados.
— O preço da energia está diretamente ligado às condições climáticas. É como uma Bolsa de Valores. Sabendo que a energia é um dos principais custos para a maioria das empresas, a orientação é firmar contratos de, no mínimo, três anos. Com isso, o cliente tem mais previsibilidade.
No colégio Centro Educacional, na Barra, a ida para o mercado livre surgiu da necessidade de otimizar custos.
— Conseguimos cortar cerca de 33% no valor total da conta. Antes de aderir, realizamos uma análise minuciosa do nosso perfil de consumo e das nossas necessidades — conta Eric Vitari, gestor administrativo da escola.
Itaú, Santander, Vivo
João Carlos Mello, CEO da consultoria Thymos, avalia que o mercado livre vive um momento de extenso “trabalho de marketing”, com empresas do setor de telefonia e bancário apostando no setor. São players que têm grande carteira de clientes e experiência em vendas, o que facilita a entrada nesse mercado.
A Vivo selou parceria com a Auren e criou a GUD Energia. A estratégia é oferecer até 30% de desconto na conta de luz. Para Fabio Balladi, diretor-geral da empresa, é uma oportunidade de entregar um novo serviço e aproveitar a força de vendas da companhia, com cinco mil funcionários.
— Vamos nos preparar para, no futuro, atuar no segmento de baixa tensão e residencial — afirma Balladi.
O Santander criou a Mesa de Energia e já superou a marca de 500 clientes. Recentemente, comprou a FIT Energia, de geração distribuída, e a consultoria América Gestão de Energia. Rafael Thomaz, head da Mesa de Energia na Tesouraria do Santander Brasil, afirma que o objetivo é oferecer uma solução completa.
O Itaú estreou no setor este ano, em parceria com a Comerc Energia, da Vibra. Inicialmente, os serviços estarão disponíveis para clientes do banco.
— A estratégia é oferecer as melhores soluções, que vão além de produtos financeiros — afirma Eric Altafim, diretor de Mesas e Produtos do Itaú.
O grupo Equatorial, que conta com sete distribuidoras no Brasil, já tem 1.300 clientes no mercado livre. Segundo Hélio Rafael, diretor de Vendas da Echoenergia, braço da Equatorial para o setor, o mercado tem ficado cada vez mais competitivo. A companhia, que acabou de adquirir a Sabesp, empresa de saneamento básico de São Paulo, já se prepara para a abertura do setor para o consumidor residencial.
— É um movimento natural — diz Rafael.
A Eletrobras abriu um escritório em São Paulo neste ano. Segundo Ítalo Freitas, vice-presidente de Comercialização e Soluções em Energia da empresa, a ideia é se tornar uma empresa voltada para o consumidor. No segundo trimestre, já tinha 551 clientes.
O que levar em conta para saber se vale a pena fazer a migração?
Empresa intermediária
Antes de aderir ao mercado livre, é preciso contratar uma comercializadora varejista de energia. Verifique se ela é credenciada na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). Pesquise também o histórico da empresa, como tempo de atuação no mercado, grupo econômico ao qual pertence e de quem ela compra energia.
Modelos de contrato
As comercializadoras oferecem diferentes tipos de contrato. Fique atento ao período de duração, que pode variar de dois a cinco anos. Especialistas sugerem evitar contratos de curto prazo para minimizar a exposição à volatilidade dos preços.
Preço
Dois tipos de descontos são os mais comuns. A empresa pode oferecer um desconto prefixado para todo o período do contrato, permitindo uma previsão sobre o valor da energia nos próximos anos. Outra modalidade envolve um desconto em relação ao preço que seria cobrado pela concessionária.
Flexibilidade
Procure entender se o contrato oferece flexibilidade em relação ao volume de energia contratado. Consumir energia em quantidade inferior ou muito superior ao acordado pode gerar pagamentos desnecessários ou custos adicionais. É importante compreender a sazonalidade. Por exemplo, padarias consomem mais energia no fim de ano, diferentemente de escolas.
Transição
O processo de migração pode levar até seis meses. Em geral, as comercializadoras cuidam dessa transição, incluindo a documentação necessária. Mas é preciso fazer ajustes nos equipamentos de medição de eletricidade. Informe-se sobre todos os custos envolvidos.
Boleto
Após a migração, serão emitidas duas contas: uma referente à energia, que cabe à comercializadora varejista, e outra da concessionária (Enel, Light etc.), referente aos custos da rede de transmissão. Em alguns casos, as duas contas são unificadas. Verifique também como será o pagamento do ICMS.
Falta de luz
Em caso de falta de luz, as comercializadoras podem auxiliar o consumidor no contato com a concessionária. No entanto, todas ressaltam que cabe ao cliente acionar diretamente a distribuidora (Light, Enel, entre outras).