Mercado está otimista com Temer, mas ressalta desafios
Com a presidente Dilma Rousseff parecendo ter chances cada vez maiores de enfrentar um impeachment até o início de maio, os investidores estão voltando suas atenções para o homem que a sucederia.
Michel Temer, o vice-presidente, tem várias características que seriam bem-vindas em um país atolado em uma recessão brutal.
Aqueles que o conhecem melhor dizem que se trata de um pragmático amigável aos negócios que desenvolveu um talento especial, ao longo de uma carreira política de décadas, para forjar acordos com seus colegas parlamentares.
Mas também há outra questão: ele corre o risco de ser retirado do cargo por acusações relacionadas ao mesmo caso de impeachment formulado contra Dilma. Espera-se que o PMDB, o partido de Temer e o maior do país, abandone a base do governo em reunião marcada para esta terça-feira.
Em apenas 30 anos desde seu retorno à democracia, o Brasil confiou duas vezes em seu vice-presidente para sair de uma crise. Em uma delas o país deu calote em suas dívidas e na outra acabou com a hiperinflação.
Os investidores se perguntam se Temer será mais parecido com o vice-presidenteJosé Sarney e seus problemáticos planos econômicos dos anos 1980 ou com o vice-presidente Itamar Franco, que lançou as bases para anos de crescimento e estabilidade nos anos 1990.
“Não haverá nenhum milagre, mas há mais tendência de alta aqui — eu estou muito otimista”, disse John Welch, economista do Canadian Imperial Bank of Commerce e observador do Brasil há longa data, que acredita que a sucessão de Temer seria um acontecimento bom.
“Ele é agregador como Itamar, um construtor de consenso. Talvez não na medida em que o mercado quer, mas certamente muito melhor do que o que temos agora”.
Com o maior déficit orçamentário da história, não haverá muito espaço para que Temer adote medidas de estímulo fiscal. Ele, contudo, agiria de forma mais efetiva para controlar os gastos do que Dilma, segundo Thiago de Aragão, sócio e diretor de estratégia da empresa de consultoria de risco político Arko Advice.
Mais importante do que isso, Temer poderia impulsionar a confiança do investidor, que está próxima de uma baixa histórica, com políticas que tirariam a mão pesada do governo sobre a economia dos 13 anos de governo do PT.
Um documento emitido pelo PMDB de Temer em outubro sustenta que o motor de crescimento do Brasil, baseado no consumo, se esgotou e precisa ser substituído por investimentos privados e ganhos de competitividade.
O partido pede uma idade de aposentadoria mais elevada e o fim das vinculações constitucionais para alguns gastos para que se consiga uma melhor alocação de recursos.
Importância maior do setor privado
O partido já aprovou um projeto de lei no Senado reduzindo a importância da estatal Petrobras e permitindo uma maior participação do setor privado na indústria do petróleo.
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Em sinal de apoio a Temer, Aécio Neves, o segundo colocado na eleição presidencial de 2014, baixou o tom de seus pedidos por novas eleições e agora está apoiando o processo de impeachment que colocaria o vice-presidente no cargo.
Temer reuniria o apoio de parlamentares de centro e de partidos de oposição para formar um governo de unidade nacional capaz até de aprovar algumas reformas constitucionais, disse o senador Tasso Jereissati, do PMDB.
Ajudando a cimentar esse apoio, legisladores do PMDB dizem que Temer, de 75 anos, se retiraria em 2018, dando a Aécio e a outros uma chance no principal cargo do país.
Não concorrerá
“Ele tomaria o compromisso de não ir para reeleição”, disse o senador Raimundo Lima, do PMDB, em entrevista. “Já falou não só pra mim, falou inclusive para membros da oposição”.
A assessoria de imprensa de Temer preferiu não comentar sobre a política econômica de um possível governo de unidade nacional, mas disse que ele tem discutido o cenário político e as propostas econômicas do PMDB.
Contudo, Temer enfrenta uma série de armadilhas que poderiam fazer dele um presidente tampão até 2018 ou até mesmo forçá-lo a deixar o cargo.
Os partidos de oposição pediram que o Tribunal Superior Eleitoral anulasse a reeleição de 2014 de Dilma, argumentando que a campanha foi financiada por propinas da Petrobras.
Se o TSE decidir a favor deles, Temer, ex- companheiro de chapa de Dilma, também poderia cair, provocando eleições gerais ou uma votação indireta para presidente no Congresso.
“Temer será uma segunda Dilma”, disse Paulo Santos, que participou dos protestos contra o governo em Brasília, neste mês, para expressar sua insatisfação com a corrupção generalizada. “Precisamos de novas eleições”.
Esse sentimento – de que o Brasil pode não estar caminhando para águas mais calmas e que mais políticos podem cair – reverbera entre os traders também.
Reginaldo Galhardo, gerente de câmbio na Treviso Corretora de Câmbio em São Paulo, disse que o mercado está tenso. “Parece que não vai sobrar ninguém”, lamentou.
Fonte: EXAME